Você me ensinou a ser forte.
Antes eu achava que o mundo ia acabar toda vez que discutíamos. Com o tempo percebi que, por pior que fosse a discussão, no fim sempre acabava ficando tudo bem entre nós, então me tornei imune a qualquer desavença. Não adianta e não precisa discutir.
Não derramo mais nem uma lágrima sequer, mesmo que às vezes a gente se ofenda. Você diz que não quer mais, eu tenho uma prévia de infarto, a perna até chega a bambear, logo eu respiro fundo, dou risada e penso: "Vou fingir que acredito."
Então, tudo bem, essa não é a primeira e nem a segunda vez que ele diz que não quer mais. Logo ele volta - pensei. Aos poucos me peguei roendo as unhas, revezando o olhar entre as notificações de mensagem no celular e os dias no calendário pregado na parede, que balançava e quebrava o silêncio do quarto enquanto um vento gelado entrava pela janela. Fazia frio e, pela primeira vez, acreditei naquela história de que o frio é psicológico, porque o frio que eu sentia não passava com agasalho nem cobertor.
Meus olhos se fixaram em um ponto qualquer enquanto eu pensava no que você poderia estar fazendo naquele momento, como estar assistindo TV em casa, no cinema com aquela sua amiguinha que eu a-do-ro ou numa noite louca fazendo as coisas mais promíscuas da vida... Estalei os dedos, chacoalhei a cabeça e os ombros como quem tenta relaxar e pensei: "Que besteira! Tudo bem, tá tudo bem, logo ele volta". Repeti.
Já era madrugada, apaguei as luzes, me deitei. Dei uma olhada nas notificações no meu celular, mas nenhuma tinha você. Então, entre um cochilo e outro, eu odiava a forma como eu não conseguia mais driblar o medo de te perder e o fato de você ter certeza disso. A minha vontade era de mandar uma mensagem, dizendo: "Ei, vem cá, vamos parar com isso? To meio louca aqui, fora da casinha, querendo um abraço seu!" Mas eu não podia. Não dessa vez.
Eu comi sozinha uma torta de chocolate. Li de novo todos os livros da minha prateleira. Ouvi todos os artistas sugeridos no meu Spotiffy. Baixei Netflix e fiz maratona de todas as séries. Adiantei todos os meus trabalhos. Mudei de emprego. Mudei de cidade, voltei. Aceitei to-dos os convites que os meus amigos me fizeram pra sair: fui em show de artista que eu nem conhecia, fui ao cinema assistir um filme que eu nem queria assistir, fui ao restaurante japonês mesmo que eu não goste de comida japonesa. Também fui em show que eu conhecia, no filme que eu queria assistir e no restaurante que eu gostava. Saí com o grupo de amigos "porra louca" na quinta e com aquele outro grupo de amigos nerds na sexta.
No sábado eu saí com umas pessoas que conheci na balada de quinta. Acordei as oito da manhã em um domingo pra "correr" com uma colega do serviço. Fui num grupo de oração com a vizinha do apartamento da direita e no yoga com a vizinha do apartamento da esquerda. Fiz uma trilha e acampei com os colegas roots da academia. Levei meus priminhos pra tomar injeção e a minha vó pra assistir o Padre. Cozinhei com a minha mãe a tarde inteira. Visitei os parentes distantes. Me encontrei com aquela amiga que não via desde a época da escola. Troquei a fralda da filha daquela outra amiga que eu não via desde o casamento dela. Fiz um bate e volta no litoral com a minha melhor amiga. Até cacei Pokemon. Tudo isso pra não querer caçar refúgio em outras coisas ou pessoas que pudessem preencher um lugar que é só seu. Tudo isso pra não enfrentar qualquer silêncio que me fazia pensar em você.
Ocupei todos os meu dias, pra quase tudo que me chamavam eu ia. Quando sobrava algum espaço na agenda, eu ia sozinha mesmo, pra qualquer canto, gastar as energias e às vezes até o dinheiro que eu nem tinha. Dei uns tropeços, caí, levantei, mas não chorei, nem enchi o saco de ninguém com as minhas lamúrias, muito menos te atormentei com a minha saudade. Embora rodeada de gente, eu só fiz tudo isso pra encontrar comigo mesma, pra aprender a carregar sozinha ou distribuir melhor os meus excessos. Fui buscar ser alguém melhor pra você e acabei me tornando alguém melhor pra mim.
Dessa forma, você foi o responsável por me fazer viver como nunca tinha vivido antes. Você não me roubou de mim, você me apresentou à mim mesma e ao mundo. Você me tirou do meu casulo e não tive outra alternativa a não ser voar. Eu só precisava aprender a usar as minhas asas, mas foi com você, pra você e por você que eu voei mais alto. E, por mais que eu tenha voado conforme o vento, no calor do sol ou nas tempestades, você ainda é o meu céu.
3 Comentários